segunda-feira, 22 de julho de 2013

pedagogia da autonomia de Paulo Freire-18 anos depois






UMA VISAO ATUALIZADA 18 ANOS DEPOIS



PEDAGOGIA DA AUTONOMIA-PAULO FEIRE
Saberes Necessários à Prática Educativa

Resenha crítica de FLAVIO FAGUNDES FERREIRA*

AS PRIMEIRAS PALAVRAS- Do autor

            A obra tem um dos seus principais pontos logo em seu início, no tópico “primeiras palavras”, de fundamental importância para a absorção da obra.Vemos um homem que, apesar da elevada idade, mantem-se incrivelmente lúcido em seus ideais, ideários , propósitos e em sua compreensão de mundo, com suas cada vez mais gritantes e absurdas injustiças.

            Tal lucidez do erudito faz com que seja alertado ao leitor que a obra não é um devaneio sobre utopias, e sim uma esperançosa contribuição na tentativa de se construir um mundo melhor, o que absolutamente quase todos os habitantes do planeta não fazem.Considera também que algumas temáticas e assuntos já haviam sido fruto de abordagens em obras anteriores, mas tudo na tentativa de construção de um quadro pedagógico consistente e fundamentalmente ético.

DA LOCALIZAÇÃO TEMPORAL DA OBRA

            O livro foi publicado no ano de 1996, certamente tendo sido compilado no ano anterior, por um homem de 73 anos que infelizmente nos deixaria já no ano seguinte. Nesses meados da década de 90, o Brasil elegia democraticamente uma ideologia escancaradamente neoliberal, representada pelo partido PSDB e seu candidato, Fernando Henrique Cardoso1, que não escondia o intuito de desmantelamento de grande parte da máquina publica em favor de uma política de mercado e todas as suas negatividades, realidade prevista por Paulo Freire e que certamente lhe foi de grande desgosto justamente nos finais de sua vida, posto que sabedor da perniciosidade de tal forma de governo e as graves consequências que o Brasil e o mundo enfrentam  nos dias de hoje.

            Naquela época, os conceitos de `globalização` , `liberalismo econômico` , `fundamentalismo islâmico` e outros tomaram de assalto o cenário mundial, como uma verdadeira avalanche de realidades prometidas mas que se revelaram totalmente enganosas.

            A queda do `muro de Berlin` em 19893, que significou o colapso das ditaduras de esquerda no `segundo mundo`, foi usado como anúncio às classes oprimidas de que as tentativas de uma politica socialista igualitária controlada pelo Estado fracassaram e uma `nova ordem mundial` estava à porta , evidentemente com farta propaganda ilusória de tempos melhores a advir.





A ATUALIDADE (Década 2011/2020)

            Passados quase vinte anos, a atualidade do livro `PEDAGOGIA DA AUTONOMIA` é realmente impressionante, bem como de profético acerto as palavras de Paulo Freire na apresentação da obra, de que a nova `ordem mundial` seria ainda de maior ruína aos oprimidos e “condenados da Terra”(sic-fls.04).Hoje temos o “Google” e sua gigantesca capacidade de pesquisa instantânea e armazenamento de dados; temos quase que um aparelho telefônico celular para cada cidadão brasileiro, com capacidade de envio de mensagens, arquivos digitais , filmetes e fotografias; temos automóveis com orientação via satélite (GPS) , sistema de acesso à rede mundial de computadores sem fio (Wireless), televisão via cabo com centenas de canais internacionais e enorme avanço na medicina.

            Em contrapartida, a fome no mundo não cede e só aumenta4, o mundo está envolto em guerras regionais por interesses escusos, existe um neocolonialismo mal disfarçado na África, o fundamentalismo islâmico tomou conta de grande parte do mundo árabe, o desemprego tomou conta dos países mais ricos e com ele o ódio étnico, o clima global está mudando rapidamente, a concentração de renda atingiu níveis alarmantes e mesmo promessas de um futuro melhor, como a`União Européia`5, estão a se esfacelar a olhos vistos.

            No Brasil, depois do governo Fernando Henrique Cardoso, e depois do advento de um governo assumidamente socialista por mais de 10 anos, o quadro é efetivamente canhestro, com concentração de renda em índices insuportáveis, analfabetismo, disparidades regionais, destruição do meio ambiente, gigantismo do Estado, violência social extrema, crime organizado, tráfico de drogas, ausência de retribuição tributária, ausência de canais de comunicação com os governos, mídia parcial e mais uma miríade de situações que deixariam o nonagenário Paulo Freire, se vivo estivesse, absolutamente perplexo e amargurado.

            À Pedagogia, portanto, caberia o fundamental papel de criar gerações aptas e dispostas a enfrentar tal gravoso e, por que não dizer , apocalíptico quadro em que vivemos, sendo uma das poucas alternativas à violência revolucionária na eterna pretensão em se mudar, ou , quando muito , melhorar o pequeno mundo em que vivemos soltos no espaço sideral.

            Em tempos de brutal ignorância `Taliban`6, a obra de Paulo Freire é como um sopro de civilização em um mundo perdido e mergulhado na escuridão , como exemplificado de forma dramática pelos fotogramas da sonda `Cassini`7 em seus instantâneos do Planeta Terra à distancia de Saturno, onde uma quase insignificante bolinha azul é um planeta em que seus habitantes dito `pensantes` não se apercebem de sua insignificância, continuando a viver cada um como se fosse o centro do Universo, o que se releva de mortal , quem diria, ignorância.

FOTOGRAFIA ENVIADA DA SONDA CASSINI DEPOIS DE SATURNO,MOSTRANDO O PLANETA TERRA POR DETRÁS DE UM DOS ANÉIS DAQUELE PLANETA (NASA-2013)


DA OBRA “ PEDAGOGIA DA AUTONOMIA”


            O Livro é apresentado em três capítulos, com cada capitulo subdividido em nove  tópicos , onde cada tópico cinge-se a um explicativo conceitual do que é `ensinar`, começando sempre com a termo `ENSINAR É...”  com tudo distribuído em 160 páginas onde a sabedoria conceitual do autor se faz presente.

            Discorrer ponto a ponto sobre os tópicos seria um trabalho infrutífero e insano, podendo ser pinçadas as ideias principais do entendimento, por assim dizer, `final`de Paulo Freire sobre como pode e deve ser a Pedagogia no quesito do `Ensino`, tema que carrega incomensurável trabalho intelectual de muitas gerações humanas e ainda se encontra em franco desenvolvimento.

            Esses pontos focais do ideário do livro podem assim serem descritos, e serão analisados por tal ordem:





Cap. 1 – Não há docência sem discência.

            A `presença` do aluno é fundamental para um bom relacionamento e desenvolvimento pedagógico, não sendo esta somente a presença física, obrigacional e desprovida de virtudes e sentimentos favoráveis à captação do saber, mas sim o efetivo `ser-aluno` em todas as suas dimensões, com a consciência que é um ser humano em processo de formação interminável e , de acordo com a idade, verdadeiro receptáculo ainda vazio de informações, saberes e tecnologias que servirão para seu ingresso em um processo civilizatório cada vez mais duvidoso e complexo.A atitude do aluno `plantado` em sala de aula é condizente com o termo criado por Paulo Freire do `ensino bancário`, onde o aluno recebe somente uma torrencial quantidade de informações dogmáticas descontextualizadas e desfocadas do objetivo de formar um ser humano com capacidades próprias de digerir, entender ,adaptar-se e ao menos tentar modificar a realidade em que vive.


1.1 – Ensinar exige rigorosidade metódica

            O Educador não pode seguir uma linha pedagógica ao sabor dos ventos, tendo sempre a consciência que o trabalho de `ensinar` é árduo e exige constante atenção às realidades envolvidas na escola e nos alunos , sempre desenvolvendo esforços para o desenvolvimento de uma mentalidade crítica, autônoma e criativa nos corpo discente, que , afinal, é totalmente permeável a tudo que lhe possam impingir. Essa atitude é de fundamental importância para que a qualidade do ensino autônomo não vá decaindo rapidamente até se tornar novamente o ensino `bancário`, tão repudiado pelo autor e que nada cria , e nem mesmo acrescenta em matéria de civilização humana. A importância desse conceito atingiu todas as áreas de ensino, como se pode observar no artigo irlandês de 2003 que trata do rigor metodológico no ensino de enfermagem avançada8.


1.2 – Ensinar exige pesquisa

            Uma temática basilar nos atuais debates pedagógicos é justamente a fundamental atitude de `pesquisa` do educador. Nada há de mais importante atualmente que o educador, em qualquer nível, manter-se atualizado, especialmente em um mundo em que as mudanças chegam a ser quase palpáveis e absurdamente rápidas, com mudanças de governos e sistemas econômicos em questão de meses, e de máquinas, equipamentos e profissões em questão de anos. Desse modo, o educador que não se mantiver atualizado, pesquisando diariamente, informando-se sobre o mundo e sua realidade estonteante, como também em sua `área`  de ensino, estará fadado a somente ser mais uma nulidade em um sistema educacional falido e subserviente.
   





1.3 – Ensinar exige respeito aos saberes dos educandos

            A realidade sócio cultural dos alunos, por mais tenebrosa que seja, sempre tem algo de bom a acrescentar e a informar, devendo o educador estar cônscio disso, sem jamais menosprezar costumes e atitudes, e estar antenado a informações e práticas das comunidades, sem fazer transparecer que seja um estranho à realidade em que se encontra lecionando. Um tema atualmente em voga hoje é o de `Pedagogia para as Primeiras Nações’, onde se tenta um resgate pedagógico histórico a etnias oriundas de povos pré-colonização. Tal método se encontra em pleno desenvolvimento no Canadá, por exemplo, mas ainda é incipiente no Brasil9.

   
1.4 – Ensinar exige criticidade

            Como consequência lógica, a pesquisa tem de estar acompanhada da devida dose de crítica por parte do lecionador.De nada adianta entupir-se de informações e conceitos a serem usados no ensino, ingenuamente e sem processar os mesmos por um mecanismo cerebral de crítica.É a diferença entre se saber que houve o Holocausto, mas por quais razões, quem lucrou, quem perdeu, quem ajudou;tudo dentro de um contexto histórico e seus reflexos atuais, e não porque Hitler odiava os judeus. O processamento crítico das informações e conhecimentos é, portanto, de fundamental importância para a tentativa de  um ensino mais completo e voltado para o crescimento do aluno e de sua realidade sócio cultural.
   
1.5 – Ensinar exige estética e ética

            A tentação proporcionada pelas facilidades de se enveredar pelos caminhos já construídos no ensino, que trazem sempre tendências ultra conservadoras e puritanismo, é percebida por Paulo Freire. Para evitar tal situação é necessário que o educador seja fundamentalmente ético, mas não de uma ética impingida a si pela sociedade ou pela época em que vice, mas uma ética construída em seu interior, onde ele possa perceber que o Mal pode estar mesmo dentro das mais inocente tendência humana, como foi o caso da Eugenia em finais do século XIX10, e o exemplo de sempre do Nacional Socialismo, onde , com a bandeira de se criar um ser humano `superior`, logo tudo descambou para uma raça superior hegemônica e destruidora das demais, e que quase destruiu o mundo.

1.6 – Ensinar exige a corporeificação das palavras pelo exemplo

            Dentro de uma óptica de ética, de nada adianta o educador desenvolver conceitos, métodos e atitudes éticas rigorosas ao mesmo tempo em que não `personificar` os mesmos diariamente. O mestre `farsante`, que apresenta ética pedagógica sólida mas que não a traduz em atitudes de vida é somente uma estátua com pés de barro. O autor cinge-se mais em uma atitude ideológica, mas tal não é somente uma das possibilidades do exemplo como virtudes de um mestre educador, que podem passar mesmo pela apresentação pessoal até mesmo por atitudes em sala de aula ou fora dela, como assédios sexual e moral , alcoolismo e preguiça. Grandes professores perderam-se com tal dicotomia, alguns grandes eruditos mas que a ressaca matutina transparecia de tal forma a embotar os ensinamentos diários11
1.7 – Ensinar exige risco, aceitação do novo e rejeição a qualquer forma de discriminação

                        Apesar da aparente obviedade dos ensinamentos aqui trazidos por Paulo Freire, o que se verifica na prática é exatamente o oposto .O ser humano é basicamente conservador em todos os seus aspectos de vida, não suportando as ideias de `risco`, `aceitação` e `rejeição` sem doses cavalares de paciência e ensinamentos contrários a tal estado de coisas. Isso é percebido de forma imediata pelo Autor, que tem ampla consciência da fragilidade interior humana e seu nefasto desserviço para a Humanidade. O educador deve estar atento a isso, não aceitando o novo` por ser `novo` , mas sim porque esse `novo‘ pode ser uma melhor adequação da realidade. O `risco` é a tentativa de inovação, ou mesmo uma tentativa de utilização de velhas técnicas ou métodos, mas que possa não provocar prejuízos e sim fazer válida uma tentativa de ministração de conhecimentos.A discriminação é algo mais perverso e sub-reptício, pois pode advir de conceitos pré-adquiridos , da aquisição de  conceitos  vividos pela pessoa ou sofridos por pessoas próximas, sendo então algo a ser abordado de forma muito cautelosa. Quando se fala em discriminação imediatamente pensa-se em raça, cor, credo, mas no mundo atual e sua diversidade a discriminação atinge todo e qualquer ser ou idéia que possa ser um tanto quanto diferente dos existentes de forma comum, indo desde capacidades cognitivas até diferenciais de idade, passando por situação econômica, beleza, pele, saúde oral e o mais que se possa imaginar fora de um quadro de realidade auto-construída, a qual o mestre se encontra embutido.Um professor de uma classe abastada e morador de um bairro mais privilegiado terá de enfrentar verdadeira enchente de contradições pessoais se for alocado para um colégio em uma periferia  violenta, o mesmo vale  para  um professor parisiense atual  que terá de lidar com uma sala com vários alunos indianos , árabes e orientais de modo a não promover cenas de pura selvageria discriminatória12

   
1.8 – Ensinar exige reflexão crítica  sobre a prática

            A tarefa básica do educador em sua formação e continuidade de vida é a eterna reflexão, e dentro dessa realidade a critica sobre sua própria prática emerge de forma pungente.O autor reconhece a dificuldades de tal entendimento, mas em verdade o próprio educador tem de submeter o estado de `como ensina` a uma crítica diária e honesta.O professor repetitivo, sem entusiasmo e que usa elementos fora de sua realidade ou da realidade em que a escola e seus alunos estão imersas obra contra si.Dada a incomensurável extensão do ensino , as práticas também podem ser infinitas , e sem a devida crítica podem se tornar meros instrumentos de uma educação monótona e distante.O mestre de obras que ensina ao aprendiz como martelar um prego de forma desleixada ou desatenciosa é um exemplo grosseiro mas perfeito sobre a questão.A prática, em todos os países , estados e cidades de um mundo em constante mudança, é algo que preocupa grande parte dos pensadores educacionais13.





1.9 – Ensinar exige o reconhecimento e a assunção da identidade cultural

            O autor reafirma a necessidade de se encontrar, revalidar e `assumir` a identidade cultural do público alvo da educação a ser ministrada , como também a do próprio mestre educador. É um tema realmente complicado  em um mundo `globalizado`, onde muitas vezes a cultura `pop` de uma nação chega a impregnar de tal modo outra que se torna difícil encontrar uma identidade cultural que não esteja soterrada por toneladas de `cultura de exportação` que não reflete realidade alguma, tanto do país de origem quanto do receptor. O mestre tem de estar atento, tanto no sentido de salvar ou manter realidades culturais ameaçadas, quanto mesmo`soterrar` modos culturais falidos ou prejudiciais à sociedade mas em franco uso14.Um professor africano que sabe da odiosa prática de extirpação clitoriana  deve `assumir` a existência dessa triste identidade cultural, mas, imbuído da devida ética e crítica, deverá lutar para sepultar tal prática, mesmo que possa lhe custar a vida. O mesmo se pode dizer de um indiano ao reprovar veementemente o estupro e o assédio sexual como condição `normal` na sociedade de seu superpopuloso e complicado país. A `assumção` da identidade cultural não é, portanto a imersão passiva em uma realidade sócio cultural, mas sim uma presença crítica e de posicionamento definido em tal realidade, com disposição mesmo a combatê-la quando evidentemente prejudicial ou retrógrada. Muito se fala da solução para os problemas (cada vez mais graves) do Brasil, mas Paulo Freire certamente diria que resta ao país a `assumção` de que é um país pobre,atrasado, ignorante  e injusto de terceiro mundo e precisa a começar a agir como tal , passando a lutar para minorar suas mazelas e não buscar um estilo de vida americano para um pequeno percentual de sua população e abandonar a maioria à própria sorte.
   
Capítulo 2

Ensinar não é transferir conhecimento

                        O título a princípio confunde, mas logo em seguida percebe-se que é a base do entendimento do Autor sobre seu `pensar certo`, ou seja , o entendimento que ensinar é antes de tudo um trabalho conjunto e árduo , envolvendo todos os conceitos anteriormente exemplificados , como ética, disciplina, prática, crítica... tudo voltado para um pleno desenvolvimento de uma verdadeira e profunda Pedagogia, onde o mestre de valor cria no aluno a possibilidade de construir seu próprio conhecimento, sem receios de demonstrar suas dúvidas e conceitos equivocados.

2.1 – Ensinar exige consciência do inacabamento

                        Do ser humano, pode-se dizer com certeza é o único animal do Planeta Terra que nasce e vai até a morte por velhice ,`inacabado’. Desse modo, a personalidade, a sede e a gama de conhecimentos adquiridos, as experiências e toda a bagagem de uma pessoa no final de sua vida são insuficientes para que se considere aquele ser `acabado´, em significado de plenitude. Ninguém vai para o túmulo com todo o conhecimento humano; com o domínio de todas as emoções humanas;de todas as línguas faladas; com o conhecimento de todas as experiências humanas, desde as mais aviltantes, como o capitão do navio que abandona os náufragos à própria sorte15 até a religiosa que dá a vida pelo enfermos em um país miserável16.Tal vivente, se alcançasse essa condição, seria uma espécie de divindade inatingível, um Ghautama deslocado da materialidade do planeta Terra. Portanto, o Autor repisa a realidade de que o ser humano está e deve sempre estar em constante crescimento interno, sob pena de regressão ou absurda estagnação ante a oportunidade única de existência como ser pensante que lhe foi agraciada de forma para sempre desconhecida.

2.2 – Ensinar exige o reconhecimento de ser condicionado

            No entendimento do Autor, o homem somente se liberta com o conhecimento, mesmo assim essa liberdade é altamente condicionada, posto que temos de respeitar as realidades e regramentos sociais que, no final, também nos agrilhoam por toda a vida. Temos a convicção que o acumulo de bens materiais também pode nos libertar das condicionantes da vida em sociedade, mas tal também é somente uma ilusão.Cabe ao mesmo não lutar como um Don Quixote contra os moinhos do condicionamento, e sim saber lidar com eles, percebendo que os monstros do condicionamento são meras quimeras ilusórias criadas desde o inicio dos tempos. Se criadas por conspiração ou não , nunca saberemos, tamanha a sutileza com que nos amordaça ao longo dos anos de formação, desde logo os primeiros meses de nascimento. Ao indiano que nasce filho de um curtidor de couros e pertence à mais baixa casta daquele triste país, o condicionante é praticamente inescapável. Ele casará com uma curtidora de couros e seus filhos , impedidos de estudar, serão curtidores de couros, e assim foi e será por incontáveis gerações.O mundo ocidental é um pouco melhor em tal aspecto, já que o direito à educação é dever do Estado na maioria dos países, e tal, se por uma sorte bem aproveitado, faz surgirem pequenos milagres de escape da condição miserável em que o discente por azares do destino nasceu.É claro que esse é um exemplo por demais radical para embasar uma tese válida, mas não é difícil, com pequena reflexão, encontrar `condicionantes` na vida de qualquer cidadão, desde o inexplicável uso de vestimentas em determinadas profissões (ex. terno e gravata para advogados em um país tropical) até a perseguição insana de `símbolos de status` de modo a , ilusoriamente, sobressair-se de um  grupo social.Cabe ao mestre educador a tentativa de ultrapassar tais condicionantes , de modo a oferecer ao discípulo uma visão mais clara e justa da realidade em que vive, e ambos construírem um entendimento pedagógico exemplar e enormemente diferenciado16.O Autor assume sua condicionante como ser humano falho e incompleto, mas se orgulha de tal e assume sua constante luta para modificar tal quadro.

2.3 – Ensinar exige respeito à autonomia  

            Talvez sendo a parte conceitual mais importante do livro, o autor tenta definir a autonomia (base de sua Pedagogia da...) na consciência de que o educando é uma individualidade autônoma.Por mais óbvio que isso possa parecer a um primeiro momento, trata-se certamente de uma abordagem revolucionária em Pedagogia.O educando passa de mero receptor de tecnologias, experiências e doutrinas, a um ser pensante, vivente, insubstituível e dono de seu próprio universo, uma entidade de valiosa participação em seu mundo, com seus sentimentos, emoções , vivencias e culturas advindas de gerações e gerações, isso em qualquer grupamento populacional do planeta.Desrespeitar essa realidade é desconsiderar a nobreza da condição humana, aviltando o educando como mera peça a ser endereçada ao mercado de trabalho de um mundo globalizado e injusto, onde somente a miséria é globalizada e a renda é absurdamente concentrada nas mãos de centenas de pessoas17.A autonomia e identidade do educando são , portanto , algo de sagrado para o educador, que deve lutar aguerridamente por tal condição, contra um ensino massificante e massacrante da individualidade, com comumente se apresenta

2.4 – Ensinar exige bom senso

            A virtude do `bom senso` ainda dispara acalorados debates filosóficos a nível mundial.O Bom senso é intimamente ligado à ética , mas deve sua vida ao conhecimento.O que os franceses chama de `sens commun` ,os ingleses `common sense` e os italianos `buonsenso` na verdade é uma decisão  intuitiva que nasce depois de uma pequena reflexão do educador ao se deparar com problemas diários em sua vida de ministrador de conhecimentos. Depende diretamente da bagagem , vivencia e sabedoria do educador, que sabe identificar `in loco` se determinada atitude será benéfica ou não.O bom senso muitas vezes não indica a atitude mais condescendente a ser tomada, mas certamente indica a melhor atitude para a situação.O bom senso age quando não se pode deixar de punir um aluno que se atrasa repetidas vezes , continuando a fazê-lo mesmo depois de avisado de seu comportamento.É o bom senso que faz com que um educador se interesse pelo que está a ocorrer com um aluno que apresenta sinais de maus tratos e resolva convocar os pais.É o bom senso que faz com que o professor advirta os alunos a não se envolverem com drogas ou que não se rendam às satisfações viscerais do mundo.Sem o bom senso, que muitas vezes é considerado a base do `jeitinho` brasileiro, situações banais e quotidianas podem virar tormentos memoráveis, como uma reunião de condomínio onde os presentes acabam por partir para as vias de fato, sem atinar que são todos vizinhos e que irão se encontrar quase que diariamente nos elevadores e nas áreas comuns do prédio. O educador de bom senso na verdade não é o ser que se deixa levar por seus instintos e por seus palpites, mas pessoa que usa de forma acertada uma certa confiança (mas não absoluta)  na decisão  mais favorável a lhe `soprar` no ouvido quando se lhe apresenta qualquer situação. Como disse Paulo Freire, é uma virtude permanente vigilante e de suma importância na vida prática.

2.5 – Ensinar exige humildade, tolerância e luta em defesa dos direitos dos educadores

            O Autor enfoca o aviltante processo de humilhação sistemática que sofrem os professores brasileiros, situação que só se agravou ao longo dos anos18.Atesta que a atitude de valorização da categoria tem de ser iniciada em cada professor, que ao mesmo tempo deve ser pessoa humilde e tolerante, posto que sem tais virtudes a vida tornar-se-á insuportável, ou então se cairá no “indiferentismo fatalistamente cínico” (sic. Pag.__) em que muitos, por comodismo ou desesperança, aderem.A altivez e a luta, mesmo que silenciosa, por melhores condições de trabalho e valorização da atividade de educador devem nortear a vida deste e do Pedagogo, posto que certamente dias melhores virão18.

2.6 – Ensinar exige apreensão da realidade

            O autor atesta que o Homem é o único animal com capacidade de aprender e apreender, mas tal capacidade tem sido relegada ao longo dos séculos por uma atitude compassiva e inerte, que permite o crescimento de todo um sistema de dominação que alcança, agora, um nível mundial e é marcado pela exclusão e pela mínima cessão de recursos para a sobrevivência de populações inteiras.Tal era abominado e grande preocupação do pensador Paulo Freire, que estaria a adivinhar nossa atual realidade, mesmo muitos anos antes. Particularmente, na apreensão da realidade, além de se entender como ser consciente em um Universo do qual não compreende absolutamente nada, o Homem precisa concatenar que precisa `querer` aprender, cabendo ao educador quebrar a inércia cognitiva que assola a maioria dos seres humanos. Chegamos a um ponto em que a maioria das populações acaba vivendo as custas de seus instintos e visceralidades, o que se revela catastrófico ante  um planeta que se encontra com os recursos próximos ao esgotamento.Ao educador cabe a muitas vezes impossível tarefa de “quebrar” tal ciclo de inercia cognitiva. Infelizmente, além de ser o único animal com capacidade de aprendizado, o homem também tem a capacidade de sobreviver sem nenhum aprendizado além do que recebido naturalmente em seu grupo primal (família) , onde enxergar e falar um dialeto rudimentar  já é o suficiente para sobreviver e, por seguinte, continuar vivendo, mesmo sem maiores aspirações e objetivos.O educador que tira uma pessoa de tal quadro incivilizatório é responsável por um pequeno milagre diário e merece todas as honras19.

   
2.7 – Ensinar exige alegria e esperança

            Em um mundo onde impera a incerteza, o Educador, segundo Paulo Freire,emerge como o portador da tocha da Esperança. Mostrando experiências próprias no Nordeste brasileiro, o autor conclui que a função primordial do educador é quebrar a cadeia historicista que condena o homem à fatalidade de seu destino como ser que veio ao mundo para sofrer e morrer20.Cabe ao educador, geração após geração, mostrar ao educando que a apreensão de conhecimentos é a única forma de sair de uma forma vegetativa de vida e permitir ao Homem a tentativa de um pleno desenvolvimento de suas capacidades e talentos.

2.8 – Ensinar exige a convicção de que a mudança é possível

            As interessante abordagens a temas da vida é uma das marcas do autor Paulo Freire, que compila frases de efeito absolutamente interessantes, como a designação de áreas que emergem como uma forte “traição a nosso direito de ser”(sic. Fls__), como favelas, palafitas e mocambos. O autor revela-se sempre indignado com as situações de miséria social e cultural, mas principalmente pela sensação de impotência a qual as pessoas que vivem nessas condições se encontram retidas. Essa perene sensação de que nada nunca irá mudar tem de ser combatida veementemente pelo educador, que precisa encontrar meios e termos de convencimento , pessoal e do educando, que a mudança é possível; que a educação e o conhecimento são uma das mais importantes, senão a únicas possíveis, para se fugir de um quadro nefasto de miséria intelectual e social. Ao educador cabe então o papel de interferir na realidade, praticamente tentando abrir uma porta ou uma janela a um mundo distante e desconhecido pelo educando, para que o mesmo ao menos possa tentar entrar.





2.9 – Ensinar exige curiosidade

            O Autor insiste que a curiosidade é de fundamental importância para o relacionamento educando aluno, sendo que se um inibe a curiosidade do outro, ambos restarão prejudicados. A curiosidade sobre a realidade é uma forma de manifestação de que o educando saiu de um estado vegetativo, trancado em si mesmo, e está apto a partir para um desenvolvimento pedagógico satisfatório.Salutar hábito , mostra que a lisergia do educando e seu tempos de total desinteresse pelo mundo que o cerca estariam próximos do fim, facilitando ao educador o desenvolvimento completo de um projeto pedagógico, que agora estará respaldado por um vivo interesse do aluno em querer absorver conhecimentos, embalado pela curiosidade.O despertar da curiosidade é portanto um sintoma formidável a mostrar  que o método pedagógico que está sendo empregado está funcionando , trazendo consigo virtudes ainda adormecidas no educando, como a intuição, a sagacidade, o interesse , principalmente, a esperança de que vai crescer interiormente.

CAPÍTULO  3

ENSINAR É UMA ESPECIFICIDADE HUMANA

                        Segundo o Autor, o mestre deve estar absolutamente seguro de sua atividade pedagógica, de modo a não deixar transparecer ao educando qualquer insegurança e não dar espaço à sensações de ilegitimidade de sua conduta como educador, a qual deve exercer com sabedoria.

3.1- Ensinar exige segurança, competência profissional e generosidade

                        Paulo Freire descortina situações em sala de aula que prejudicam a atividade educativa, como a expressão `mandonismo`(sic. Fls__) que retrata o professor truculento e desapegado a uma verdadeira atitude ética e que só traz problemas de insuportabilidade nas relações mestre educando, tornando o ambiente de classe pesado e insatisfatório. Os exemplos se multiplicam e são parte de extenuantes estudos psicológicos relativos ao ambiente escolar e em ambientes em que haja alguma espécie de ensino sem a institucionalização escolar propriamente dita21.
            A generosidade envolvida seria o desapego do mestre ao seu saber, quando o mesmo estaria disposto a desnudar-se totalmente e a transmitir todo o seu`tesouro`de conhecimentos , praticas e métodos, e não apenas a pequena parcela de conhecimento traduzida em seu roteiro pedagógico para aquele ano, série ou objetivo.
            É interessante notar que o Autor sempre repisa os conceitos de respeito, como condição essencial ao educador como pessoa e como profissional, sendo tal virtude um caminho de duas vias, devendo respeitar o discente e ser por ele respeitado, como condição sine qua non para se estabelecer um verdadeiro elo pedagógico com resultados satisfatórios. Fora de tal realidade somente o falso respeito ou o receio imperam.
            Atualmente, passados quase vinte anos, o respeito aos professores virou tema obrigatório, quando mestres são agredidos em sala de aula e fora dela, alguns com casos mesmo de lesões corporais graves e homicídios, o que é impensável em se tratando de uma sociedade que se autoproclama `civilizada`. O Autor passaria por maus momentos de desilusão com o atual estado de coisas brasileiro, infelizmente.
            Politicas publicas e de classe terão de ser tomadas de forma emergencial para transmudar tal quadro, sob pena de a cada ano a impossibilidade de se lecionar sem ser agredido vai ser cada vez menor em plagas brasileiras22.

3.2 – Ensinar exige comprometimento

            O `comprometimento` é outro fator de preocupação do Autor.é uma atitude pensada de modo a definir o mestre como realmente ser vivenciador de sua experiência como educador, colocar a atividade de `ser mestre` como a principal de sua existência , o que lhe traz afazeres e responsabilidades mesmo fora do horário de trabalho.O comprometimento do educador é com a verdade, a verdade de vida e a verdade da realidade.É uma atitude constante e diuturna em que o mestre não pode vacilar ou falsear ante problemas que surgirem, tanto com o conhecimento a ser ministrado, explorado, criado quanto com a realidade de cada aluno em comparação com a do educador.Resulta dizer que o professor é mestre durante as 24 horas do dia, sete dias por semana, doze meses por ano, e não somente no horário de aula, com `folgas’ do comprometimento aos sábados, domingos , férias e feriados.O comprometimento é uma atitude árdua e que exige sacrifícios os mais variados, mas é uma postura de vida e profissional de incalculável satisfação pessoal, mesmo que em princípio possa cobrar muitas horas de diversão barata ou lazer.O professor tem de estar smepre à disposição de seus discentes, em problemas matemáticos ou da vida, posto que na maior parte das vezes é o único vivente com capacidade de resolução próxima ao aluno, que nem sempre pode contar com a própria família para resolvê-los ou esclarecê-los.O comprometimento faz do professor um mestre completo. Atualmente em nosso social quadro caótico brasileiro, o que se ve com tristeza são cada vez mais professores desiludidos com o `sistema`, mal ministrando aulas e o fazendo somente por obrigação.Muitos com raiva dos alunos, raiva da escola em que são alocados e raiva de sua própria vida de lecionador.Realmente uma lástima23.

3.3 – Ensinar exige compreender que a educação é uma forma de intervenção no mundo.

                        O Autor revela a preocupação de que a educação, por mais tacanha que possa ser, é uma espécie de intervenção no mundo, tanto do educador quanto do educando.A educação, mesmo diabolicamente voltada para a reprodução de ideologias dominantes, consegue escapulir para auxiliar a desmascarar essa mesma ideologia, como uma escola Taliban onde os meninos são obrigados a recitar o Alcorão até a exaustão e acabam por descobrir da pior forma possível que o que estão fazendo é de uma insanidade sem precedentes na história humana, mesmo assim aquela seria a única realidade de tais meninos para se fugir da miséria no deserto e dos maus tratos do pai severíssimo. A Educação , no entender do Autor, jamais poderá ser neutra. Se tentar, sua passividade será de ofensa à inteligência dos alunos, pois sua atitude abúlica quanto à realidade logo será notada. Se posicionada para a opressão ou para o mal, também seu destino logo será a destruição. O verdadeiro papel da escola, mesmo já na época clássica grega24, é a procura do bem, de modo a construir um cidadão também de bem. Ideologias têm de passar ao largo do ambiente de ensino, que poderá, no máximo, abrir os olhos dos educandos acerca do que está por detrás de tal e qual ideologia, e quem na verdade lucra com isso. Uma escola que se dedica a implantar uma ideologia voltada para a dominação e o bem de poucos, ou para a hegemonia de uma raça ou classe social, verdadeiramente não é uma escola e sim mera fábrica de loucos inconsequentes.
   
3.4 – Ensinar exige liberdade e autoridade

            O Autor sabidamente sofreu perseguição politica, inclusive sem exilado politico mesmo assim o conceito de liberdade total em métodos de ensino e pedagógicos em geral não é aceito pelo mesmo. Ele alerta que liberdade não pode ser tomada como licenciosidade, e que liberdade total é prejudicial a quem quer que seja, notadamente educandos em idade a qual não conseguem ou não podem tomar decisões fundamentadas. Nesse item, a liberdade é controlada, administrada ou vigiada pela autoridade, que não é a autoridade corpórea de um policial militar ou de um delegado, e sim a tomada de ciência da função do educador como autoridade dentro de seu trabalho pedagógico. Ao educador é devido o respeito e a obediência, sob pena de total impossibilidade de se desenvolver qualquer atividade que exija um mínimo de concentração. Mas essa autoridade tem de ser sopesada ao extremo de modo a não restringir os direitos e anseios do educando, que não devem ver na figura do educador um tirano, um algoz ou um simples `bedel` de comportamentos. Essa autoridade tem sido cada vez mais pisada nos tempos atuais, com a extrema dificuldade dos professores em manter mesmo que o silencia em sala de aula, principalmente nas escolas da rede pública, em uma total indiferença à pretensa autoridade do mestre, a qual aparentemente não mais existe em um país com excesso de leis comportamentais. Vai ser necessário todo um trabalho de soerguimento pedagógico para se resgatar a autoridade do professor brasileiro, mas para isso muito da legislação atual que ampara menores e menores delinquentes em duvidosos arcabouços protetivos terá de ser eliminada24


3.5 – Ensinar exige tomada consciente de decisões

            A educação de intervenção no undo é uma das aspirações do Autor.Nao a educação revolucionária e carbonária, mas uma educação que adeque o homem a enfrentar e a tentar mudar as realidades em que, por azares inexplicáveis, nasceu.Desse modo, educar para tal formação exige decisões rápidas, como a decisão de que se está exagerando ou não na dose ideológica dos ensinamentos, ou minorando situações perversas, ou mesmo explicando situações sociais relacionais de forma equivocada ou evidentemente oriundos de uma conclusão própria e não devidamente embasada.É ceto que errar é humano, mas ao educador deve ser exigido o maior esforço possível para que haja com a devida sabedoria em suas decisões.Um excelente exemplo é o ensino da educação sexual.Até onde ir com o aluno? Deve ser ensinada somente uma visão mecanicista do ato sexual ou uma visão mais humana e voltada para sentimentos? Deve se alertar o educando quanto aos perigos de uma vida promíscua ou ficar calado para que o mesmo descubra por si?
            Percebe-se que em qualquer tópico que possa ser ensinado as duvidas afloram imediatamente, cabendo ao educador descer de seu pedestal de falsa superioridade como homem que se acha culto, e partir para o enfrentamento dessas questões dentro da mais escorreita linha de pensamento, exaustivamente sopesada e elaborada de modo a se evitar injustiças mesmo interiores com a ministração de ensinamentos truncados, equivocados, camuflados ou mesmo indisfarçavelmente errados.
3.6 – Ensinar exige saber escutar

                        Ao educador é vedada a atitude de superioridade intelectual, a falsa modéstia, a empáfia auto-enganosa, que impedem a oitiva das opiniões e conceitos de terceiros. O ser humano que assim age está cego por sua enganosa erudição, é somente um pobre coitado que não tem consciência da insignificância da existência humana e que todos convivemos em um mesmo barco que caminha diretamente a uma destruição violenta se a atitude de cada um perante a vida não mudar muito rapidamente25.Como ser vivente incompleto e em eterna formação , a oitiva , principalmente de pessoas sem a mesma sorte de letramento do educador, é um exercício de paciência e humildade que pode resultar em excelentes frutos. Ninguém é tão onipresente de modo a ter tido todo tipo de experiências humanas, desde sentimentais até periclitantes episódios de violência, episódios de abandono, desconsideração, traição e vilipêndio que não possa absorver tais experiências usando de sua capacidade auditiva. O educador muitas vezes é o único confidente do educando, uma única tabua de salvação flutuando em um oceano de desesperança, e deve estar ao seu lado em todas as horas, e principalmente disposto e apto a ouvi-lo, mas essa oitiva não pode ser passiva ou somente efetuada para um arquivamento nos anais mentais do mestre, e sim algo que provoca um conselho, uma reação , um melhor entendimento da realidade por parte do educador e do aluno.
                        É essencial a existência de tal canal de comunicação entre educando e educador de modo a criar uma confiança mútua absolutamente salutar. De nada adianta o mestre ser uma parede sem ouvidos e nada tentar absorver dos problemas, questionamentos, experiências e perigos enfrentados pelo aluno, que por fim irão somente acrescentar ao intelecto e vivência do próprio educador.

3.7 - Ensinar exige reconhecer que a educação é ideológica.

            O temor pelo crescimento e açambarcamento mundial da doutrina neoliberal econômica preocupava enormemente o Autor, mas imediatamente percebe-se que ele estava certo em seus temores. O mundo hoje vive em perigosa crise econômica, onde os que mais sofrem são justamente os países subdesenvolvidos, que estão somente à mercê do capital especulativo e do endividamento para tentarem alavancar algum tipo de progresso, o qu esse revela impossível. Os países socialistas , por sua vez, estão virtualmente falidos e com grande parte da atirada ao desemprego. Realmente a onda neoliberal funcionou mais do que devia, posto que como exemplificado antes cerca de 300 pessoas detém mais dinheiro hoje do que 3 bilhões de pessoas, ou metade da população mundial. Chega a ser risível ouvir no antigo seriado da Televisão americana Batman (1966)25 , emblemático da década de sessenta, que o `milionário` Bruce Wayne estava fazendo filantropia em Gothan City, quando atualmente multiplicam-se os `bilionários`, já existindo notícias da existência de alguns `trilionários` que não fazem a menor questão de serem reconhecidos. As corporações, por conta do neoliberalismo, tomaram conta da maioria dos  governos, que de forma aparentemente absurda passam a operar politicas `sociais` benéficas às empresas , e não às suas populações. As guerras para satisfazer uma indústria armamentista gigantesca e o aparecimento da hedionda figura da`guerra terceirizada`26 são como os últimos pregos de uma espécie de sarcófago para a Humanidade, que não está vendo condições de escapar de tal sinistra realidade. Evidentemente Paulo Freire apostava na Pedagogia como uma das únicas formas de escape da tal sinistra situação, mas uma educação voltada para o bem comum, para o engrandecimento do ser humano e para o abrigo, principalmente, dos menos favorecidos. Ao educador cabe o papel de resistência de modo a se evitar um final lastimável para a raça humana, seja pela guerra, seja pelo exaurimento do planeta.

3.8 Ensinar exige disponibilidade para o diálogo.

                        O Autor apregoa que, embasado no respeito ao próximo e as ideologias de vida e necessidades, ao educador cabe a disponibilidade para o diálogo. O diálogo como válida troca de experiências e aprendizados, em uma somatória de todas as bases discutidas anteriormente. O autor alerta para o atual poder massificante da mídia, que retira de populações inteiras a capacidade de pensar, analisar, julgar sob o bombardeio de informações constantes mas que são impingidas de forma rápida e sem a devida maturação ou aprofundamento, criando no povo a sensação de que se encontra `bem informado` quando na verdade foi severamente alvejado por pequenos dardos de violência e desfaçatez. Um espelho sujo da realidade, que nada acrescenta e somente brutaliza ainda mais quem se encontra as voltas com o emparedamento da educação. O diálogo é pedagógico no sentido de que se pode observar o que as pessoas estão a entender e a compreender da realidade em que vivem, e, sem tentar influenciá-las, abrir-lhes os olhos para que não engulam realidades impostas.

3.9- Ensinar exige querer bem aos educandos

            O querer bem não significa um amor desbaratado ao corpo discente , e sim um respeitoso e digno relacionamento , que que mesmo situações as mais complicadas serão olhadas por um manto de sentimentos abonadores mas não prejudiciais.Um aluno querido mas que foi mal em sua prova porque nada estudou não pode ser aprovado porque o professor `gosta dele`.É situação complexa e que pode ser utilizada mesma na vida diária, como um pai que ama seus filhos mas não pode deixar de ser severo em situações que se apresentam.

CONCLUSÃO

            Realmente a ultima obra de Paulo Freire funcionou com um grand finale de sua carreira, onde desponta mais um humanista abnegado e preocupado com os destinos do planeta do que um mero professor de sala de aula. As preocupações esposadas pelo mesmo se mostram acertadas, com o mundo a cada ano que passa mais ameaçado por um sem número de vícios e problemas, como se o Mal resolvesse atacar de forma uníssona nos últimos tempos.
            Ouvimos sempre alguém dizendo que`o mundo sempre foi assim, só que as noticias não corriam como agora`, com guerras, injustiças e dor; mas as armas atômicas, as armas de destruição em massa, a poluição, o aquecimento global , a superpopulação e mais centenas de problemas que agora se apresentam são capazes sim de destruir a raça humana de forma a nada restar. Foi-se o tempo em que o matuto mascando um bom pedaço de cana no interior de Minas Gerais não sabia que a Europa estava em guerra ou quem era Hitler  há setenta anos atrás. Hoje, a ameaça fundamentalista é uma realidade para qualquer país, posto que o fundamentalismo não é um `privilégio` barbarizante somente dos muçulmanos, podendo assumir as crenças mais `inocentes` e virar-se para o Mal.A má distribuição de renda, o retorno de um imperialismo a serviço de um complexo industrial  militar faminto por despejar sua produção na cabeça de mulheres e crianças de qualquer país são ameaças sérias e presentes.O Brasil deixou de ser aquele país distante, cheio de barrigudinhos de esquistossomose, matas virgens, praias selvagens, com mulatos, cerveja e Carnaval para ser, com certeza, uma gorda prenda com seus recursos naturais e seus governantes amorais à frente de um mercado de 200 milhões de pessoas desarmadas por um governo que , agora, se mostra perdido em um imenso mar de corrupção , burocracia e crime organizado.
            A saída para tal situação é por demais impossível, com o quadro tendendo a agravar anualmente ao invés de se buscar seriamente uma solução. Solução esta que pode ser, não a muito custo, encontrada em uma Pedagogia de valor, que possa formar paulatinamente gerações que abominem o futebol e amem o documentário, que gostem de praia mas amem a leitura, que descubram que álcool cozinha o cérebro , que sexo é uma coisa natural da vida e não o motivo de se viver, que um carro do ano no ano que vem não será mais um carro do ano,que viajar para a Disney só vai deixar mais ricos quem um dia lhe jogará bombas teleguiadas em sua cabeça sem nem sair do conforto do lar, que a cultura de um país tem de ser preservada e desenvolvida e que o professor, aquele vivente sofrido e angustiado de nossos dias,que  mal e mal tem levado um país à frente, mesmo com todas suas mazelas, merece todo nosso apoio, respeito e consideração.

NOTAS:


1-Governo Fernando Henrique Cardoso
2- -Francisco Quintanilha Véras Neto, Márcia Regina da Silva Quintanilha Véras, Bruno Cozza Saraiva- Globalização, Neoliberalismo e Direito: os fundamentos históricos da ordem jurídica atual na percepção destas esferas Revista Ambito Juridico-Nº 111 - Ano XVI - ABRIL/2013 - ISSN - 1518-0360
5-European Comission- Causes of European Crisis- http://ec.europa.eu/economy_finance/publications/publication15887_en.pdf
6-Taliban war agains women- http://www.law.georgetown.edu/rossrights/docs/reports/taliban.pdf -Físicos do mndo em favor dos Direitos Humanos-Boston
8-IN G.A. & BEGLEY C.M. (2004) TOBIN G.A. & BEGLEY C.M. (2004) -Methodological rigour within a qualitative framework) Journal of Advanced Nursing 48(4), 388–396(
9- Faith Maina-CULTURAllY RELEVANT PEDAGOGY:FIRST NATIONS EDUCATION IN CANADA-Centre for the Study of Curriculum and Instruction University of British Columbia-Vancouver, British Co
10-Daniel Wikler University of Wisconsin, USA-Can we learn from eugenics? Journal of Medical Ethics 1999;25:183-194
11-Catia vanessa Alves parreira-padrao de consumo de álcool pelos professores da comunidade do espinho,Portugal- http://bdigital.ufp.pt/bitstream/10284/1652/3/Mono_16708.pdf
12- Philippe Perrenoud -L’école face à la diversité des cultures-La pédagogie différenciée entre exigence d’égalité et droit à la différence-Faculté de psychologie et des sciences de l’éducation-Université de Genève-2005


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